Arco-íris cinza
- Maria Gisele Knust
- 8 de jan. de 2015
- 2 min de leitura
Pelas orelhas. Foi como o agarrei bem forte e o puxei para junto de mim. O apertei contra o meu peito na esperança que, mesmo sem ver, ele me reconhecesse pelo tum-tum de outrora. Afinal, passara nove meses embalado nesse batimento sem fim. Ele estava sem roupa, talvez sem alma também. Tirei a minha e lhe dei. A roupa, naturalmente, a alma, mesmo que eu desejasse lhe dar, não era permitido. Enquanto eu chorava esganada, tentando expurgar todo o medo que senti de não o ver mais, ele mantinha o mesmo silêncio de nove meses de cativeiro. Eu queria engoli-lo, para dentro do meu ventre ele ficar protegido para sempre. Soltei as orelhas e o envolvi tão forte em meus braços que os paramédicos interviram para que eu não o machucasse ainda mais. Ele desmaiou. Não existe nada mais violento do que duas buchas de algodão metidas no nariz de alguém. Eu agradeci por reencontrá-lo ainda quentinho. Poderia estar frio. E abraçar alguém frio é doloroso demais. Eu já vivenciei algumas tempestades na minha vida, e em todas elas eu percebia que se o meu coração estivesse em paz eu veria que um arco-íris cada nuvem traz.
Na primeira vez que o seu coração é destruído você descobre uma força que não sabe que existe dentro de você e o reconstrói. Quando seu coração é destruído pela segunda vez, você conhece a força que tem, com um pouco mais de paciência, você faz tudo de novo. Mas quando o seu coração, todo remendado, é destruído pela terceira ou quarta vez, você se dá o direito de permanecer triste para sempre. O que os tanques de guerra podem destruir de uma cidade em ruínas? O sequestro do meu filho foi a maior tempestade da minha vida. Reencontrá-lo, meu arco-íris cinza.
Comments